Carta- Poema - Carta número 1

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https://www.letras.mus.br/jose-miguel-wisnik/384632/

 

Ió. Que linda manhã de verão. Fico orgulhosa ao me ver aqui. Eu conheci o Teat(r)o Oficina em 2007 quando uma grande amiga que já virou estrela, me convidou para assistir ao espetáculo Homem I de Os Sertões, obra de Euclides da Cunha antropofagiado e transcriado pelo Oficina. Quando vi o espaço de atuação fiquei muito impressionada, mas quando o espetáculo começou eu tive uma das grandes revelações artísticas de minha vida. Presenciei um espetáculo-rito onde abri a percepção, ali vi e senti a verdade cênica, vontade, fé cênica e presença.

Naquela época eu tinha apenas sete anos de teatro, estava na universidade fazendo Bacharelado em Artes Cênicas após ter feito licenciatura em Teatro, atuei em dois grupos: Grupo de Teatro Finos Trapos que fui membro-fundadora e que continua em atividade. Este foi fundado com artistas de Vitória da Conquista-BA que já se conheciam de outros grupos de teatro; Grupo Os 50tões formado por alunos do curso de graduação em Interpretação em Artes Cênicas da UFBA. Pesquisas diferentes, cada qual com suas buscas estéticas e desejos. Eu sempre tive a sensação de que estava de passagem, tinha a vontade de morar no Rio de Janeiro, pois além de ter um campo artístico aberto tinha mar, água salgada, água de Iemanjá. Muitas possibilidades, possíveis oportunidades, um lugar lindo, se fosse sair da Bahia iria pra lá. Bem, depois que vi os quatro espetáculos de Os Sertões tudo mudou. Aquela semana parecia um carnaval, havia uma alegria contínua, energia, vibração e eu estava sentindo tudo aquilo no teatro. Com o Oficina via a possibilidade de dizer, de ser-estar no presente e conectada com a multidão. Acredito na potência do teatro de estádio, teatro para multidões como o carnaval, como o futebol que são paixões mundiais. Um teatro ritual, um teatro que se pauta na presença no aqui agora, senti naquele momento que precisava estar no Oficina, senti que era necessidade artística, tive vontade de embarcar com a Cia, mas sabia que precisava de tempo para me preparar, como se prepara um alimento antes de devorar.

Saí de Salvador, mas nunca abandonei minha terra. Fui até a praia do Porto da Barra e pedi a benção pra Iemanjá e disse:

- Eu vou pra todo ano poder voltar.

Sempre quando vou à Bahia, vou em Salvador, no mar, agradeço a Iemanjá e peço a benção e vou para Vitória da Conquista, retorno ao útero-coração de Mainha, minha primeira casa. Me recarrego no aconchego, no colo, revejo memórias, escuto os ecos da minha experiência e sigo. Agora preciso ouvir e cantar as canções para ensaiar mais tarde. Um beijo.

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